A piometra é uma das doenças reprodutivas mais graves que podem afetar cadelas e gatas. Segundo um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), publicado em 2025, uma em cada quatro fêmeas desenvolverá a doença ao longo da vida.
Trata-se de uma infecção inflamatória do útero, associada à ação da progesterona, hormônio responsável por preparar e manter o organismo da fêmea durante a gestação.
Mesmo quando não há prenhez, a cadela permanece exposta a altas concentrações desse hormônio por 45 a 75 dias após o cio, criando um ambiente propício para o acúmulo de secreções e a proliferação bacteriana.
Muitos tutores só percebem a piometra quando a cadela apresenta sinais evidentes, como secreção vaginal purulenta, apatia ou aumento abdominal.
No entanto, em alguns casos a doença pode evoluir de forma silenciosa, o que torna o diagnóstico ainda mais difícil e aumenta o risco de complicações.
Para compreender tudo sobre a piometra em cadelas, contamos com a colaboração da médica-veterinária Nathalia Martins (CRMV-SP 39844). Neste artigo, você vai entender em detalhes os sintomas, causas, formas de tratamento e medidas de prevenção.
O que é piometra em cadelas?
A piometra é uma infecção bacteriana grave no útero de cadelas não castradas. A doença acontece quando, após o cio, o organismo da fêmea permanece sob altas concentrações de progesterona.
O resultado é o acúmulo de pus no interior do útero, que provoca inflamação intensa e coloca a vida da fêmea em risco. Sem diagnóstico e tratamento rápidos, a doença pode evoluir para infecção generalizada (sepse) e levar ao óbito.
Na prática, isso significa que mesmo cadelas que nunca cruzaram podem desenvolver a doença. A piometra não está relacionada apenas à gestação, mas sim ao ciclo hormonal natural da fêmea.
Tipos de piometra
A piometra pode ser classificada em dois tipos principais: aberta e fechada. A diferença está no fato de o colo do útero permanecer aberto ou não para a saída da secreção.
Piometra aberta
O colo do útero permanece aberto e a secreção purulenta escapa pela vagina. Esse corrimento pode ser observado na vulva, na pele e nos pelos sob a cauda ou até na cama onde a cadela se deitou. A fêmea pode ou não apresentar febre, apatia e perda de apetite.
Piometra fechada
O colo do útero está fechado e o pus não consegue sair. Isso faz com que o útero fique distendido, aumentando rapidamente o risco de ruptura e infecção generalizada.
Os sinais costumam ser mais graves: a cadela fica apática, não se alimenta, pode apresentar vômitos ou diarreia e evolui rapidamente para um quadro grave.
Um estudo de Lima (2019) destaca que os riscos de sepse e endotoxemia são muito maiores na piometra fechada. Além disso, tanto na forma aberta quanto na fechada, as toxinas liberadas pelas bactérias afetam os rins, levando a aumento da urina e maior ingestão de água.
Esse detalhe é essencial: muitas vezes a piometra fechada passa despercebida, porque não há corrimento visível. O tutor nota apenas sinais inespecíficos, como apatia ou falta de apetite, o que pode atrasar o diagnóstico, já que também combinam com outras doenças.
O que causa piometra em cadelas?
A piometra em cadelas é uma doença multifatorial, resultado da interação entre alterações hormonais, mudanças estruturais no útero e infecção bacteriana.
Durante o cio da cadela, dois hormônios principais têm papel decisivo:
- Estrógeno: age no início do ciclo e provoca o relaxamento do colo do útero (cérvix). Isso permite a cópula, mas também facilita a entrada de bactérias que vivem normalmente na vagina.
- Progesterona: predominante na fase de diestro (algumas semanas após o cio), provoca o espessamento do endométrio e estimula as glândulas uterinas a produzirem secreções.
Quando esses processos se repetem em vários ciclos de cio, o útero vai sofrendo alterações acumuladas.
Uma das alterações mais comuns é a chamada hiperplasia endometrial cística (HEC), que nada mais é do que um “engrossamento” da parede do útero com acúmulo de líquidos. Esse cenário cria o ambiente perfeito para a proliferação de bactérias.
A própria progesterona também contribui para isso, pois reduz a capacidade defensiva local do útero, permitindo que os microrganismos se instalem e se multipliquem com mais facilidade.
Entre as principais bactérias que causam a piometra está a Escherichia coli, é a mais frequentemente envolvida, já que apresenta maior afinidade com as células do endométrio sob ação da progesterona (LIMA, 2019).
Um estudo conduzido por Gariglio et al. mostrou que essa bactéria é responsável por mais de 90% dos casos de piometra em cadelas.
Além disso, outras bactérias mais frequentemente isoladas nos casos de piometra são: Streptococcus spp., Staphylococcus aureus, Proteus spp. e Pseudomonas spp.
Por que a piometra acontece?

A doença é consequência da exposição repetida à progesterona após os ciclos de cio, mesmo sem prenhez. Esse hormônio altera o endométrio (camada interna do útero), criando um ambiente propício para a multiplicação de bactérias.
O estudo da UFMG explica que o risco é progressivo: quanto mais cios a cadela tiver sem ser castrada, maior a chance de desenvolver a infecção.
A piometra pode se manifestar fora do período do cio?
A piometra não costuma aparecer durante o cio, mas sim algumas semanas depois, na fase de diestro, o período de “descanso” entre os cios, quando a cadela já não aceita a monta e há alta liberação de progesterona.
Segundo a médica-veterinária Nathalia Martins (CRMV-SP 39844):
“A piometra se manifesta algumas semanas após o cio, normalmente na fase de diestro. É nesse período, entre 4 e 8 semanas após o cio, que há maior liberação de progesterona, deixando o útero mais vulnerável ao desenvolvimento da doença.”
Essa fase do ciclo reprodutivo, aliada ao envelhecimento natural do útero, explica por que o risco aumenta conforme a cadela envelhece.
Raças com maior predisposição a piometra
Embora a piometra possa ocorrer em cadelas de qualquer raça, alguns estudos apontam uma incidência mais elevada em determinadas linhagens. Entre as mais predispostas estão:
- Pastor Alemão;
- Golden Retriever;
- Labrador Retriever;
- Rottweiler;
- Doberman Pinscher;
- Setter Irlandês.
De acordo com levantamentos clínicos (Melo, Andrade e Garcia, 2020), a prevalência nessas raças pode ser até duas vezes maior do que em cães sem predisposição genética.
Outros fatores de risco para a piometra em cadelas
Além da predisposição genética, outros aspectos aumentam bastante as chances de desenvolvimento da doença:
- Idade: a piometra é mais comum em fêmeas adultas e idosas, acometendo cerca de 25% das cadelas com mais de 10 anos. Ocorre, principalmente, na primeira metade do diestro e também após o uso de progesterona sintética.
- Histórico reprodutivo: múltiplos cios ao longo da vida favorecem alterações no útero.
- Não castração: a presença do útero é condição obrigatória para que a piometra se desenvolva.
- Uso de anticoncepcionais hormonais: prática perigosa que altera o equilíbrio reprodutivo e aumenta drasticamente o risco de piometra e de tumores de mama.
A veterinária Nathalia Martins reforça esse alerta:
“O uso de anticoncepcional injetável aumenta em quase 99% o risco de piometra, além de elevar as chances de câncer. É uma prática condenada pela medicina veterinária, mas ainda realizada de forma irresponsável em casas de ração e agropecuárias.”
Portanto, além da predisposição genética, a castração segue sendo o principal fator de proteção contra a piometra.
Esse cuidado elimina a possibilidade de infecção uterina em fêmeas (útero de cadela com piometra) e continua sendo a medida mais eficaz no combate a doença.
Quais são os sintomas da piometra?

A piometra pode apresentar sinais clínicos claros ou sutis, que variam conforme o colo do útero está aberto ou fechado. A tabela abaixo resume os principais sinais:
Piometra aberta em cadelas | Piometra fechada em cadelas |
Corrimento vaginal purulento (pus) ou sanguinolento | Aumento do volume abdominal (inchado ou dolorido) |
Secreção marrom, amarelada ou com odor forte | Letargia (animal muito quieto) e fraqueza |
Febre | Falta de apetite |
Desidratação | Vômitos e diarreia |
– | Polidipsia (sede excessiva) |
– | Poliúria (micção frequente) |
– | Gengivas pálidas |
Nathalia Martins alerta: “No início, sinais como falta de apetite e apatia podem passar despercebidos. Mas, mesmo os casos de sintomas inespecíficos devem levar o tutor ao veterinário.”
Esse ponto é fundamental porque muitos tutores só procuram atendimento quando percebem secreção vaginal.
Sintomas de piometra em gatas
Embora menos comum, a piometra em gatas também afeta fêmeas não castradas e apresenta sinais semelhantes aos das cadelas:
- corrimento purulento ou sanguinolento pela vulva;
- febre;
- prostração;
- falta de apetite.
A piometra felina é uma emergência médica. Ao notar qualquer um desses sintomas, o tutor deve procurar atendimento veterinário imediatamente.
Como é feito o diagnóstico da piometra?
O diagnóstico da piometra é baseado em uma combinação de anamnese, sinais clínicos, exames laboratoriais e ultrassonografia. A rapidez nesse processo é essencial, já que o atraso no tratamento aumenta o risco de septicemia.
De modo geral, a avaliação combina três etapas principais:
- Avaliação clínica: o veterinário investiga o histórico da cadela ou gata, observando alterações como apatia, secreções vaginais e aumento abdominal.
- Exames laboratoriais: o hemograma costuma mostrar aumento expressivo de leucócitos e segmentados, sinal de infecção sistêmica. Alterações em parâmetros bioquímicos também podem aparecer.
- Ultrassonografia abdominal: é o exame confirmatório, permitindo visualizar o útero dilatado e cheio de líquido. Além disso, ajuda a diferenciar a piometra de condições como gestação ou pseudociese.
“O ultrassom é fundamental para diferenciar a piometra de outras condições, como gestação ou pseudociese.”
Doenças com sinais e sintomas semelhantes a piometra
A piometra pode ser confundida com outras doenças uterinas, como a hemometra (acúmulo de sangue no útero) e a mucometra (acúmulo de muco).
“Todas elas têm diferentes graus de risco, exigem avaliação veterinária imediata e, geralmente, o tratamento é cirúrgico”, explicou.
A piometra tem cura?
Sim, apesar do prognóstico da piometra ser reservado, por se tratar de uma emergência médica. Quando diagnosticada precocemente e tratada adequadamente, a chance de recuperação é alta.
Qual o tratamento da piometra?
O tratamento da piometra é considerado uma emergência médica e, na maioria dos casos, precisa ser feito por meio da cirurgia de ovariohisterectomia (OSH), que remove útero e ovários.
É o único tratamento capaz de curar a doença, já que elimina a fonte da infecção e impede que volte a acontecer. A médica-veterinária Nathalia Martins reforça:
“Se há realmente o diagnóstico de piometra, deve-se realizar a cirurgia. Não existe tratamento seguro apenas com antibióticos, sem a intervenção cirúrgica. Isso pode colocar a vida do animal em risco”.
Existe tratamento só com medicamentos?
“Em situações muito específicas, o veterinário pode indicar antibióticos ou hormonioterapia como suporte, mas esses métodos não substituem a cirurgia e apresentam alto risco de recidiva”, responde.
Quais são os riscos da cirurgia?
Como a piometra costuma surgir em cadelas e gatas mais velhas, a anestesia já é naturalmente mais delicada.
Além disso, o estado do útero também influencia: em alguns animais, o órgão chega a ficar dez vezes maior que o normal, cheio de pus e com risco de ruptura.
Essas condições, somadas a complicações como anemia ou infecção generalizada, tornam a cirurgia mais arriscada.
Por isso, a cirurgia deve ser feita sempre em ambiente preparado, com anestesia inalatória e acompanhamento de equipe especializada.

Mas, a veterinária destaca: “a cirurgia imediata aumenta muito as chances de recuperação. Quanto mais cedo for feita, menor é o risco de complicações.”
Dúvidas comuns sobre a recuperação após a cirurgia de piometra
A médica-veterinária Nathalia Martins respondeu às principais perguntas de tutores sobre o pós-operatório:
Quanto tempo dura a recuperação e quais cuidados são necessários?
A recuperação costuma levar de 10 a 15 dias, quando acontece a retirada dos pontos. Nesse período, o tutor deve:
- manter a cadela em repouso;
- seguir corretamente a administração das medicações;
- garantir boa hidratação e alimentação.
Quais sinais exigem atenção imediata?
Segundo Nathalia Martins, se a cadela apresentar xixi com sangue, secreção na vulva, falta de apetite ou vômito, é preciso retornar ao veterinário sem demora.
A cadela pode ter sequelas após o tratamento?
Depois da cirurgia, a fêmea não poderá mais ter filhotes. Algumas podem ganhar peso ou ficar mais tranquilas, mas isso varia de um animal para outro.
A piometra pode voltar após a cirurgia?
Não. Como o útero é totalmente retirado, não há risco da doença reaparecer.
E o que é piometra de coto?
Embora a piometra não volte após a retirada completa do útero, existe uma condição semelhante chamada piometra de coto.
É uma condição que pode acontecer em cadelas castradas quando sobra um pequeno resquício de ovário ou útero após a cirurgia.
Esse tecido ainda responde aos hormônios, o que pode levar ao acúmulo de secreção e infecção, mesmo após a castração. Por isso, o ideal é que a cirurgia seja sempre feita de forma completa e por um profissional capacitado.
Existe prevenção para a piometra?
Sim. A castração preventiva (ovariohisterectomia) é a forma mais eficaz de evitar a doença. Além de proteger contra a piometra, também reduz de forma significativa o risco de tumores de mama, que têm forte relação com os hormônios reprodutivos.
No Brasil, porém, a maioria das fêmeas ainda é castrada apenas quando a piometra já está instalada. Em países como Estados Unidos e Canadá, cerca de 85% das cadelas são castradas de forma preventiva (VOLPATO; LOPES, 2022).
Vale ressaltar, a recomendação da castração pode variar conforme o porte:
- Cadelas de pequeno e médio porte – castração geralmente indicada após o primeiro cio;
- Cadelas de grande e gigante porte – recomendada após o terceiro cio, quando o desenvolvimento corporal já está consolidado.
Cada animal deve ser avaliado individualmente, e somente o médico-veterinário pode indicar o momento mais seguro para a castração. A Nathalia Martins reforça:
“A castração não é apenas um controle populacional, mas uma medida essencial de saúde para cadela ou gata”.

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